Boletim ABRADEMI
São Paulo, 17 de março de 2006 – nº 78
Editorial:
O RETORNO DO BOLETIM
Na ata de fundação da ABRADEMI, escrita em fevereiro de 1984, consta como objetivo principal “a divulgação do mangá”. Na época, parecia que tal objetivo jamais seria alcançado. Nem nos jornais da colônia japonesa as pessoas tinham idéia do que era um mangá. Chegou-se a ser confundido com uma cooperativa de fruticultores – daà o acento no “gá”. Numa época em que a sociedade brasileira via as histórias em quadrinhos como “subleitura perniciosa à juventude”, a Abrademi batalhou pelo reconhecimento do mangá como manifestação de cultura e arte, e realizou as primeiras exposições do gênero em museus, galerias e universidades. Em tempos nos quais não haviam computadores pessoais, internet ou celulares, o contato entre os associados era à base de boletins datilografados, impressos em mimeógrafos a álcool ou xerox.
Cada carta representava uma luta contra as dificuldades de comunicação, de um correio distante, caro e demorado, tanto para o endereçado como para o remetente. Nas reuniões as dezenas de cartas eram divididas entre os diretores para que cada uma fosse adequadamente respondida. Era o mÃnimo – na maioria dos casos o máximo – que podia-se fazer. Em 1996, num único mês a Abrademi respondeu 83 cartas, e imprimiu e remeteu mais de 4 mil boletins. Naquele mês, só em despesa com correio foi gasto 1097 reais. A única renda da ABRADEMI vinha dos cursos, que mal cobriram a impressão dos boletins – muito menos o custo do correio. Para tentar cobrir o déficit, foi organizada uma festa para arrecadar fundos que se tornou o primeiro MangáCon. O resto é história.
Ao longo de duas décadas surgiram muitos amigos. Foi tocante a consideração que a entidade sempre recebeu da admirada classe dos dubladores, que citou em eventos e entrevistas nos últimos anos que a ABRADEMI foi a pioneira na construção da comunidade fanzinÃstica do mangá e do animê no Brasil. A Abrademi criou cursos, eventos e concursos, fanzines (um dos quais foi usado para dar nome a uma livraria em São Paulo), implantou o concurso de cosplay e o animê-kê no Brasil e realizou shows. Tudo podia ter dado errado, mas fomos pioneiros porque arriscamos quando ninguém queria arriscar. Também aprendemos pela experiência um triste fato universal: o de que todos os pioneiros têm crÃticos e detratores (que são invejosos, incapazes, revoltados, perdedores… a lista é enorme).
Na virada do milênio, constatamos que muito havia mudado desde a época em que ninguém sabia o que era o mangá. Se estivesse vivo hoje, o Tezukasensei não conseguiria mais andar à vontade pelas ruas, como ele fez durante sua primeira e única visita ao Brasil. O mangá e o animê estavam de tal forma assimilados pela juventude no paÃs, que a luta para manter a associação com múltiplas atividades e divulgar o assunto não era mais necessária. A Abrademi havia cumprido o objetivo. Os pioneiros estavam cansados e precisavam reduzir o ritmo.
De 2000 para cá, coisas inesperadas passaram a ocorrer. Mesmo sem atualização, nosso site continuou recebendo um volume considerável de visitas. No Orkut, ex-associados criaram uma comunidade auto-denominada “Os Ex-ABRADEMI” (coisa estranha, ter gente usando uma passagem de muitos anos atrás pela associação como identidade). Ao longo de 2005 vários mails chegaram pedindo a retomada ou realização de atividades. Pessoas das quais não se tinha notÃcia há muito entraram em contato. Chegaram os filhos e netos, de mudanças de cidades, de paÃses, de profissão, de estado civil e de estado de saúde – histórias humanas, como é natural ocorrer após mais de duas décadas de estrada, pois a vida segue e envelhecer é inevitável.
A maior parte das mensagens, entretanto, não eram de ex-associados. Eram mails de fãs pedindo “informações e conteúdo sobre mangás e animês” em nosso site (pedidos estranhos, considerando que o site da ABRADEMI, que entrou no ar em 10 de janeiro de 1998, foi feito para divulgar atividades internas da associação). Um “retorno” da ABRADEMI, nos moldes em que ela atuava antes de 2000, é inviável hoje, mas a atualização do site como um tipo de revista digital foi cogitada. Conversando com os membros que ainda se mantêm em contato, a idéia foi discutida e chegou-se a uma reformulação do site da ABRADEMI.
Assim, a partir de agora, março de 2006, o BOLETIM ABRADEMI volta exclusivamente no site, retomando a numeração em que parou quando era impresso em papel, sofrendo atualizações trimestrais ou a qualquer momento. Qualquer pessoa poderá saber o que ocorre nesta velha associação, que faz parte da história do mangá e do animê no Brasil, mas está antenada com tudo que ocorre neste curioso mundo em constante mutação. Depois de 5 anos sem emitir boletim, este primeiro está extenso.
O site será reformulado com a criação de espaços para comentar o que acontece internacionalmente no meio dos mangás e animês, com matérias escritas por membros da associação, que serão divididas em blocos temáticos. 20 ANOS DE CAVALEIROS homenageia a criação do mangá e do animê que deu inÃcio ao atual movimento fanzinÃstico no paÃs. GEKIGà REVIEW é especializado em mangás dramáticos para o público adulto. SHÕJO WORLD mostra que o mundo dos mangás femininos é mais variado e complexo do que se imagina. LEITURA CRÃTICA centraliza matérias de análise. ANIMÊ CORNER é o espaço reservado à animação japonesa. Por exclusão, o que não se referir aos temas citados estará no MANGà NEWS. Esperamos tornar o site da ABRADEMI o maior arquivo de informações em português de caráter cultural sobre o mundo do mangá e do animê disponibilizado na internet. Temos consciência de nosso papel de referência e de formação de opinião no assunto.
Quando a ABRADEMI passou a atuar em low profile há 5 anos, sabia-se que essa saÃda dos holofotes reduziria o reconhecimento da caracterÃstica artÃstica do mangá e do animê no Brasil, pela qual a entidade batalhou ao longo de décadas, e que o comercial prevaleceria. Era uma tendência irreversÃvel. Nos últimos anos, mangá e animê viraram “produto”. O lado positivo disso foi a popularização do mangá e do animê, que sempre foi o principal objetivo de quem realmente queria divulgar o assunto. O reverso da moeda foi que na hora em que mangás e animês passaram a ser tratados como “produto”, como mais um gibi ou DVD na prateleira, o lado artÃstico foi relegado a segundo plano, e desvalorizado pelo fato do mangá e do animê terem se popularizado.
Novos e talentosos desenhistas brasileiros surgiram nos últimos anos, mas mesmo com o crescimento do comércio de mangás e de produtos relacionados a animês, oportunidades para desenhistas não foram ampliadas na mesma proporção. Ao contrário, elas vêm escasseando. Por isso, ainda pedem para a Abrademi realizar cursos e o Contest, que foram portas de entrada para vários desenhistas hoje na ativa no Brasil. Agradecemos a todos que nos escreveram ou enviaram mails pedindo isso, mas a atual diretoria não pensa em retomar os cursos ou o Contest. A Abrademi já fez a sua parte. Durante 18 anos, os cursos, eventos e concursos da ABRADEMI formaram um público amplo e sólido para o mangá e o animê no Brasil em condições totalmente adversas. Agora que as condições são comercialmente melhores, cabe às editoras e demais empresas que lidam com mangás e animês, que lucram com o apreço dos fãs, fazerem um pequeno esforço para realizar cursos e concursos confiáveis, e criar efetivas oportunidades de publicação e mercado no Brasil, já que literalmente vivem deste público.
A Diretoria
MATSURIS
Um lado que pouca gente conhece da ABRADEMI, é que alguns de seus membros não são meros freqüentadores de eventos relacionados a mangá e animê. No bairro da Liberdade em São Paulo, duas grandes festas populares são realizadas todos os anos: o Tanabata Matsuri (Festival das Estrelas) em julho, e o Toyo Matsuri (Festival do Oriente), em dezembro.
Nestes eventos, a Praça da Liberdade, a rua Galvão Bueno e a rua dos Estudantes são interditadas, e dezenas de milhares de pessoas se apinham para assistir a apresentações de música, danças e artes marciais. Organizar o fluxo da multidão de pessoas na região, a montagem e desmontagem dos enfeites nas ruas e a limpeza no fim do evento é realizada por um pequeno exército de jovens voluntários chamado “Seinen Liberdade”. Durante madrugadas que antecedem tais eventos, e nos dias e noites que eles duram, esses jovens montam o circo, fazem o show acontecer e ainda limpam o picadeiro, mantendo o controle de tudo o que acontece no local.
Nesses matsuris a gente aprende a se divertir sob enorme pressão, e a difÃcil arte de bem conviver em grupos de pessoas muito diferentes entre si, em idade, temperamentos e gostos: o verdadeiro espÃrito de equipe. A grande recompensa é chegar ao fim do dia sem nenhum incidente, e dividir comida e bebida de batalhão, falando sobre as coisas engraçadas que ocorreram ao longo de dias de correria.
Há sete anos, membros da ABRADEMI juntam-se ao “Seinen Liberdade” nessas ocasiões. A Érica e o Ernesto já se entrosaram: chegam, cumprimentam o pessoal, vestem o happi e vão com a turma. A Adriana, quando não carrega cadeiras ou fica dando informações para turistas, está distribuindo água e lanches para os “Seinen” na rua. Houve um ano em que os cariocas vieram ao Tanabata Matsuri. Com dificuldade para conseguir ingressos para um evento de animê, o Allen, o Felipe e o Wladimir não tiveram dúvida: resolveram ir à Liberdade, enfrentaram o frio e derrubaram bambús como nunca.
Ajudar nesses eventos como voluntários é apenas nossa demonstração de gratidão com um bairro, que todas as pessoas ligadas ao mangá e ao animê freqüentam como o quintal de suas casas, embora a maioria não cuide do bairro como se fosse a própria casa. A Liberdade é um paraÃso para os otakus, o principal centro da comunidade fanzinÃstica e uma referência turÃstica nacional. Se o bairro decair e perder suas caracterÃsticas, todo mundo perde, otaku ou não, e isso pode acontecer mais rápido do que se imagina. São pouquÃssimas as pessoas que estão batalhando para que isso não ocorra. Na próxima vez que fôr à Liberdade, pense como seria se ela não existisse e tome alguma iniciativa. Se quiser informações sobre o “Seinen Liberdade”, procure a Assoc. Cultural e Assistencial da Liberdade, na Av. Liberdade 365, de 2ª a 6ª das 9 à s 18h.
8º Festival do Japão
Nos dias 15, 16 e 17 de julho de 2005, ocorreu o VIII Festival do Japão, no Centro de Exposições Imigrantes em São Paulo. Organizado pela Federação das Associações de ProvÃncias do Japão no Brasil, com apoio do Consulado Geral do Japão em São Paulo e da Fundação Japão, este ano o evento teve como tema principal “Mangá e Animê”. Concebido para ser uma ampla experiência do que o Japão tem de tÃpico em cultura, culinária e produtos, o evento atraiu 150 mil pessoas ao Centro Imigrantes, o que causou enorme congestionamento na Rodovia dos Imigrantes e nas avenidas Bandeirantes e Ricardo Jafet, principais vias de acesso da zona sul de São Paulo.
Na área cultural, foram montados estandes que abrangeram temas como a cerimônia do chá, a confecção tradicional de pipas gigantes, a caligrafia tradicional, a fabricação dos sofisticados papéiswashi, as especialidades de Okinawa e muitos outros assuntos. Empresas nipo-brasileiras e japonesas também se fizeram presentes. As gigantes Toyota, Honda e Panasonic fizeram lançamentos de seus podutos. Uma ampla e variada praça de alimentação com especialidades de provÃncias do Japão (muitos pratos que não se encontram em restaurantes) atraÃram enorme interesse. No palco principal, houve várias apresentações de danças folclóricas, grupos de taiko e deyosakoi soran, misto de dança tradicional com música de ritmo pop que está atraindo a moçada. Filas e congestionamento de gente no evento foram inevitáveis.
Convidada pela organização para promover as atividades-tema do evento, a ABRADEMI ocupou um estande de 200m2. Sob o tema “nostalgia”, montamos uma exposição com painéis de animês e séries live-action que fizeram mesmo quem não é fã voltar à infância, com as músicas-temas dessas séries tocando de fundo. Estando numa área elevada,
reservamos parte do estande para usar como um palco secundário, onde o Grupo Teatral Hokage, o Grupo Zen Taiko e os campeões de yoyo extreme da Associação Brasileira de Ioiô se revezaram em várias apresentações e arrasaram. As editoras Conrad e JBC montaram pontos de venda em nosso estande, ao lado da Brincos de Origami (novidade interessante: minúsculos origamis rÃgidos e brilhantes montados na forma de brincos). Workshops de desenho clássico e de mangá foram ministrados pelos professores da Escola Atelier, e quem quisesse ter uma caricatura de si bastava posar por alguns minutos para os desenhistas da Japan Sunset. Os mágicos do Oriental Magic Show deram uma apresentação bastante aplaudida pelo público, que adorou ser iludido.
Nos poucos intervalos entre uma atração e outra, fizemos mostras de vÃdeo para demonstrar a qualidade da nova linha de equipamentos da Panasonic Home Theater, DVD e Flat TV LCD 50″ (deu medo de perguntar quanto custava aquilo tudo). Mesmo com toda a movimentação e barulho no estande, grupos se formaram diante do imponente sistema. Dos muitos clipes apresentados, o que parece ter agradado mais, curiosamente, foi o da série live-action da “Sailor Moon”. Adultos e crianças paravam para assistir (é preciso considerar que no Festival o público é majoritariamente de famÃlias e pessoas normais). Montamos um balcão de 3 metros para atender dúvidas, dar informações e distribuir folhetos: divulgação dos DVDs dos “Cavaleiros” e “Yu Yu Hakusho”, e do filme “Castelo Animado” o último longa de Hayao Miyazaki. A Daniela, a Célia, o Allen, a Adriana e a Andrea, entre outros, atenderam o público durante o evento.
No auditório principal foram feitas palestras e um debate. Sonia Luyten, além de falar sobre mangá, também promoveu o livro “Cultura Pop Japonesa: Mangá e Animê”, compilação de palestras e debates realizados no I Seminário Internacional de Cultura Pop Japonesa – Fórum Mangá, organizado pela Sonia em 2003 em Santos. Cristiane Sato falou sobre animê e coordenou um debate sobre a animação atual com os diretores Walbercy Ribas (conhecido diretor de animação na publicidade brasileira, produtor de “O Grilo Feliz”) e Megumu Ishiguro (diretor de animação japonês, responsável pelo estúdio Dõga Kobo), que veio ao Brasil através da Fundação Japão promover o primeiro longa-metragem produzido por seu estúdio, “Kahei no Umi” (O Mar de Kahei), inspirado num livro sobre a história real de Kahei, lÃder de uma comunidade de pescadores em Hokkaido no final do séc. XVIII, época na qual a Rússia já disputava territórios com o Japão. O animê foi exibido antes do debate.
No último dia, um vendaval causou alguns estragos no evento, chegando a derrubar um grande torii cenográfico que foi instalado na entrada do Centro Imigrantes. A ventania abalou as divisórias de vários estandes, inclusive o nosso. Decidimos retirar o material exposto nas divisórias e desmontá-las antes que alguém se machucasse. Excetuando este contratempo, tudo correu bem, mas este final feliz não foi obra do acaso. Quando literalmente várias divisórias ameaçavam voar, dezenas de jovens voluntários formaram paredes humanas segurando as divisórias e dirigiram o público para locais protegidos. Agradecemos a todos que nos ajudaram, naquela hora e durante todo o evento, em especial ao Alexandre Sonoki, o Daniel Takaki e o Fausto Shiraiwa, lÃderes do “Seinen Liberdade” que coordenaram os voluntários no Festival do Japão.
O estande da ABRADEMI foi certamente o lugar mais fotografado de todo o evento, mas um único Ãtem ganhou o tÃtulo de campeão de fotos do Festival: o boneco em tamanho real do Ultraman. Nós o instalamos num lugar que por si já chamava enorme atenção – no meio do topo da arquibancada central, onde montamos nosso palco, como se ele estivesse poderosamente observando todo o resto do evento a seus pés. Formavam-se filas para tirar uma foto ao lado do Ultraman. Ele vivia cercado de gente – visto de longe, parecia uma celebridade. Foi divertido observar a reação das pessoas. Teve gente abraçando e beijando o boneco. Maior barato!
PRÉ-ESTRÉIA DE “O CASTELO ANIMADO”
Em julho de 2005, a Playarte Filmes, com o apoio do Consulado Geral do Japão em São Paulo e da ABRADEMI, realizou a pré-estréia de “O Castelo Animado” (Howl no Ugoku Shiro), a mais recente produção do Studio Ghibli, dirigida por Hayao Miyazaki. Especialmente para este animê, a Playarte realizou uma sessão dupla simultânea, em duas salas diferentes no complexo do Center 3: uma cópia dublada e outra legendada. Ambas as salas, que somaram 1300 lugares, lotaram. A todos que vieram, agradecemos por terem feito desta pré-estréia um sucesso. Denisar, valeu pela ajuda para organizar as filas.
Olá!
Que nostalgia ver que vocês tem site e estão firmes ainda. Lembro de vocês da revista heróis e que na época era meu informativo sobre cultura japonesa e sempre quis fazer parte da abrademi heheheh (na época era como um super clube pra mim)
Vida longa e próspera a todos
Eu gostaria de saber ,com quantos anos se pode entrar na abrademi…isso é tudo