A Abrademi e a Responsabilidade Social
Desde o início de suas atividades, a Abrademi se pautou pela palavra “responsabilidade”, o que era muito importante porque ela não tinha nenhum apoio. Para ser respeitada era preciso ter consciência de que tudo precisava ser correto e feito da melhor forma possível. Nisso, ajudar o próximo também era um item importante.
Na reunião do dia 6 de abril de 1986, portanto, dois anos após sua fundação, os associados decidiram doar todo o dinheiro arrecadado até então, para a Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa (Bunkyo), que estava fazendo uma campanha para a construção do seu centro esportivo e cultural, anexo ao prédio antigo. Havia uma explicação para isso. Como o presidente do Bunkyo, Masuichi Omi, havia incentivado a criação da Abrademi e tinha isentado a taxa de locação da sala do Bunkyo usada para as aulas, a Abrademi entendeu que era a hora de retribuir àquela generosidade.
Vale lembrar que, naquela época, qualquer iniciativa jovem era mal vista em qualquer entidade nikkei, porque seus líderes temiam perder o cantinho que eles suaram para construir, e é claro, ninguém àquela altura pensava em sucessão, se não entre eles. Mas o Bunkyo havia cedido sua sala para as aulas. Embora não pudesse fazer reserva com muita antecedência, visto que só podia ocupar a sala quando ninguém solicitava, aquilo era uma grande ajuda. Pode-se dizer até que a Abrademi não teria sobrevivido sem aquela ajuda inicial.
Foram muitas as aulas realizadas, geralmente aos domingos, para crianças e jovens que queriam aprender a desenhar, e o resultado foi uma importância razoável que pôde ser doada ao Bunkyo. O valor, que em moeda atual pode ser algo em torno de cinco mil reais, foi entregue pessoalmente na casa de Masuichi Omi. O Omi-san quase chorou de alegria ao receber a doação. Não que fosse um valor substancial para construir um prédio, mas foi pelo gesto daqueles jovens. Ele disse na ocasião que aquela doação foi a primeira recebida de uma associação, apesar de toda campanha que estava fazendo. Ele disse também que queria que aquele gesto fosse divulgado nos jornais e que ele iria providenciar isso.
O que se viu nos dias seguintes foi o oposto. A secretaria do Bunkyo ligou dizendo que a Abrademi teria que pagar o seu aluguel, como outras entidades, e mesmo a aula já marcada precisaria ser paga. Tomado de surpresa pela nossa ação de doação, um funcionário antigo, o secretário, do Bunkyo resolveu “se vingar” dos jovens folgados provavelmente porque achava que estavam tentando ficar famosos aproveitando a boa vontade da entidade. Assim, nada saiu nos jornais e a história foi esquecida. Só que dali em diante, todas as locações tiveram que ser pagas, antecipadamente, e seguindo a tabela normal de locação.
Com isso, ficou mais difícil economizar e guardar dinheiro para as doações. Mesmo assim, as aulas continuaram no mesmo local até 1991. Em 1992, a Abrademi “se mudou” para a Associação Shizuoka, na rua Vergueiro, 193, onde o aluguel era semelhante, mas a sala era melhor e maior.
A Formação de Cidadãos Conscientes
Em junho de 1991, a Abrademi começou a participar com um estande das Expo-Feiras Culturais organizadas pela Royal Consultants, da dra. Mitsue, que era itinerante. Ali, a Abrademi levava uma exposição de desenhos e atendia ao público fazendo retratos e caricaturas. O evento durava geralmente 3 ou 4 dias, e todos se hospedavam nos alojamentos cedidos pela prefeitura local. Nesses eventos, os diretores sentiram a necessidade de treinar associados para se tornarem líderes, não só da Abrademi, como também da sociedade em geral. Teoricamente daria, porque todos eram jovens e estudantes. A Abrademi já tinha seus líderes, alguns dos quais Já eram líderes em suas comunidades jovens, como Alexandre Funashima, Eduardo Ikenaga e Edison Matsuzake, mas a ideia era formar mais gente consciente, como parte da responsabilidade social da entidade. A iniciativa teve início com a Marly Kamiyama, estudante que trouxe ideias novas da Câmara Junior, que mais tarde se formaria em pedagogia na USP. Foram realizadas várias atividades de integração para recepcionar os novos associados, e a Abrademi chegou a participar, com os citados, do primeiro evento de revitalização das entidades promovido pelo Bunkyo. Houve também um evento de integração num sítio cedido pela família do Mario Rezende e uma churrascada no sítio do vice-presidente Wilson Iguti.
Além dessas ações, havia o Projeto Serra Negra, que começou com um trabalho comunitário realizado pela Abrademi em 1993, na cidade de Serra Negra, visitando escola e orfanato e fazendo atividades com as crianças utilizando o mangá como instrumento principal. Essa atividade também foi coordenada pela Marly Kamiyama, e foi repetida em outras localidades, como Atibaia.
Retomando a doação às entidades beneficentes
A doação em dinheiro às entidades foi retomada em 1994. No mês de aniversário da Abrademi, fevereiro, foi realizada uma aula de Kirigami da profa. Naomi Uezu, e o montante arrecadado foi Cr$ 144.900,00 (R$ 4.400,00 atualizado em janeiro/2020 pelo IGP-DI), que era um valor alto para a Abrademi já que os alunos pagavam em média Cr$ 1.500,00 (R$ 45,00 em 2020) por aula. Essa importância bruta, com a Abrademi arcando com todas as despesas, inclusive o aluguel, foi doada ao Hospital Santa Cruz.
No ano seguinte, o curso de técnicas de aguada com o professor Roberto Otsu, realizado em 12/2/1995, resultou na doação à Associação Pró-Vítima do Terremoto de Hyogo, para ajudar as vítimas do terrível terremoto que afetou principalmente as cidades de Kobe e Osaka no Japão.
Há registro de uma doação em dinheiro feita em 28/2/1997 para a Associação Kodomo-no-Sono, e também doação de brinquedos para uma associação de Capão Bonito/SP, que estava montando uma brinquedoteca. Também houve uma doação em dinheiro para a Abeuni – Associação Beneficente Universitária, que fazia caravanas de saúde no interior de São Paulo
Trabalhando pela cultura
Na parte cultural, para incentivar a criatividade, a Abrademi criou o Concurso de Mangá Abrademi Contest, que foi realizado por cinco anos seguidos, e no último conseguiu patrocínio para premiar os melhores com duas viagens ao Japão, bolsas de estudo e outros prêmios. Pelo mesmo raciocínio, a Abrademi realizou por duas vezes o Concurso de Desenho pela Paz, onde os desenhos podiam ser de qualquer estilo. Todos esses concursos eram atividades sem qualquer receita, com a Abrademi doando sua experiência e tempo de seus diretores e professores para o bem comum. Os patrocínios eram apenas de prêmios aos participantes.
A Abrademi sempre participou de eventos culturais em prefeituras, centros culturais e escolas, com a finalidade de divulgar o mangá como cultura japonesa e também para proporcionar algum ensinamento e entretenimento para as comunidades regionais.